António Pepe uma força da natureza aos 100 anos de vida

Nascido a 1 de Julho de 1907, na Quinta do Ameal, na freguesia de Póvoa de Midões, António Pepe é aos 100 anos uma verdadeira força da natureza. Um exemplo de vida que todos os seus familiares e amigos admiram. “Um homem bom, alegre, divertido, cheio de vida”, dizem-nos satisfeitos por terem o tio Pepe tão próximo e tão “rijo”.
Com vontade de durar mais uma dezena de anos, António Pepe festejou o seu século de vida rodeado de amor e carinho, no restaurante a “Paragem”, na Venda da Serra. Mais do que um dia memorável, o dia 1 de Julho de 2007 foi uma experiência única na vida de todos os presentes. “É um momento único, uma marca na minha vida. Nunca tinha dado parabéns a alguém que tinha feito 100 anos. Obrigada pela sua força”, agradeceu ao aniversariante Leonor Gomes em nome de todos os convivas.
Sempre com o lema “como e calo” bem presente, António Pepe diz que devemos guardar o melhor para nós. “Posso ter uma rapariga, ela quer e eu quero… como e calo, mais nada”, explica-nos para melhor percebermos como se atingem 100 anos de vida com um discurso fluente, um raciocínio perfeito e uma memória de génio.
Talvez, o segredo esteja no facto de nunca ter “fumado um cigarro, nem bebido um copo de vinho, desde que ando a trabalhar, de uma vez”, revela-nos alertando que não sabe se “será disso”. Contudo, uma das razões a seu ver é a Fé que tem com a Nossa Senhora dos Milagres. “Quando ia para uma viagem longe dizia: - Nossa Senhora dos Milagres vá comigo em bem. Eu sou religioso e, agarro-me à Nossa Senhora dos Milagres”, conta-nos.

“O Pepe é mais esperto que a gente. Come e cala, ninguém sabe nada dele”
Em pequeno tinha por hábito ir pescar peixe ao rio Mondego, “mas tínhamos que ir de noite armar a nassa, para ao outro dia trazermos aos 5 kilos”, recorda explicando que a Guarda não queria que se pescasse. “Hoje encheram aí os rios de peixes encarnados e tudo. Mas, naquele tempo, era aquele peixe bom”, lembra-se com saudade.
Criado no campo, até aos 13 anos de idade, diz-nos que pagava a renda ao dono da Quinta, com 13 mões e meio de milho, 23 alqueires de feijão, 3 galinhas e 2 vassouras de milho.
Realidade que não agradava ao tio Pepe, pois por vezes não conseguiam pagar a pensão. Como, por exemplo, naquele dia em que tivemos de “ficar a dever 1 conto de réis, para o governo da casa que era 14 arrobas, um porco”.
Assim, um dia disse à mãe que queria sair da Quinta do Ameal. “Oh, mãe eu quero ir para o Alentejo, ou para o Porto, ou para Coimbra. Não posso estar aqui! Então a gente, tudo que ganha é para o patrão?”
Por influência do destino ou não. A família Pepe recebeu a visita de um “homem de Lisboa, que era ainda compadre” da mãe do tio Pepe. “O meu filho quer ir para Lisboa, diz que não quer estar aqui, disse a minha mãe. Diz o senhor: ele quer ir para a mercearia? Precisava lá de um rapaz para uma mercearia…”
“E, então… cheguei lá e, diz assim o patrão: Oh, Tonito, tu queres vir cá para a mercearia?”. “Então, eu fui lá para a mercearia”.
Porém, o emprego de António Pepe estava condenado. “Trazia sempre o dinheiro no bolso de trás e, à noite punha debaixo das tábuas da cama, só para não saberem que eu que o levava. Arranjei 4 contos e mandei-os para os meus pais, para comprarem uma junta de bois e, lá fiquei”, remata. Até que um dia… “diz assim o senhor: tem que sair daqui, porque a mercearia foi passada a uns senhores do Brasil”.
E, como diz a velha máxima “fecha-se uma porta, abre-se logo outra”. António Pepe, passado 8 dias encontrou a “Sapataria Oliveira, calça Lisboa inteira” e, lá ficou. “Depois, vi lá um homem com um casaco às costas todo enfarinhado e, depois disse assim: o meu amigo é padeiro?
– Sou. Sou amassador
Ah! Sabe, eu estava numa mercearia, mas agora não tenho trabalho, mas não me importava de ser padeiro. Disse assim o homem: vá lá ter com os meus patrões. Metem-no lá”.
Assim foi. “Estive lá… ainda entrei para a tropa. Na tropa era o 452”, diz-nos orgulhoso por ter dado nas vistas. A dada altura, “O tenente chama-me: oh, 452, então os colegas não me fazem continência e, és só tu?
- Oh, meu tenente eu chamo-os.
Oh, meninos andem cá. Então vocês não fazem continência ao tenente? Qualquer dia vão todos para a cadeia.
Ora, não passava um que não fizesse continência e, disse assim o tenente: Anda cá 452. Tu queres ir à tua terra? – Meu tenente, se me der autorização. Fui 15 dias à terra e, depois voltei”.
Terminada a tropa. O tio Pepe foi, novamente bafejado, com uma oferta de trabalho. “Diz assim um senhor: Oh, meu amigo você quer ganhar dinheiro?”
E, mais uma vez o tio Pepe não negou a oferta. “Oh, meu amigo, se quero. Eu não tenho dinheiro nenhum, saí da tropa”, respondeu.
“Então você vai um mês para um escritório que a gente tem” e, lá ficou.
Aos 80 anos, veio para a sua terra natal e deixou a vida de taxista, que exerceu desde 1930 a 1993. “Lá fui muito querido”, refere com alguma nostalgia.

“Naquele tempo, para se arranjar um conto de réis para pagar uma letra dos carros fartava-me de trabalhar”

Aos 66 anos de idade ficou viúvo. “Namorei 3 anos com ela. Nunca lhe dei um beijo se não quando me casei”. Hoje vive, com Olívia Simões, já “tem 17 anos comigo”.
Defensor de que hoje se está “a viver melhor”, aponta a sua vida como “cruel”. “Naquele tempo, para se arranjar um conto de réis para pagar uma letra dos carros fartava-me de trabalhar”.
Aos mais novos diz-lhes para não fumarem que é um veneno e, para não beberem enquanto trabalham. Talvez, seja esta a chave da longevidade. O que é certo é que António Pepe é uma verdadeira força da natureza, alegre, bem-disposto e com um coração enorme. É o orgulho dos seus sobrinhos e amigos. Um exemplo de vida.
Cristina Correia Pinto
O Tabuense

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