João Castanheira Nunes: “o gigante da resistência, da determinação”

“- Morreu o sr João!
Foi esta a terrível, a dolorosa notícia que recebemos na manhã de sábado passado. Na sua frieza impiedosa, no seu laconismo impressionante, no seu intenso dramatismo, aí estava a nova receada, em que recusávamos acreditar.”
in A Comarca de Arganil, de 17 de Novembro de 1981

É estranho como o tempo corre veloz, e… hoje faz, precisamente, 25 anos desde o dia em “que o gigante da resistência, da determinação, fora vencido!”.
Filho de António Castanheira Nunes Júnior e de Adelaide da Conceição e Castanheira, João Castanheira Nunes nasceu a 17 de Dezembro de 1921. Casado com Maria da Graça, era pai de João Alberto, José António e avô de Gonçalo e Sérgio.
O nosso camarada “sofria de grave deficiência renal que, desde 1979, o obrigava a submeter-se, dia-sim-dia-não, à hemodiálise, em Coimbra” e na passada “sexta-feira, o estado de saúde do enfermo, agravou-se de tal forma que viria a ser internado às 2 da madrugada de sábado, na Casa de Saúde da Sofia. Acompanhado de sua dedicada esposa e de seus extremosos filhos e nora, rodeado de todos os cuidados de médicos e enfermeiros, foram feitos os mais desesperados esforços para evitar o desenlace que a todo o momento se adivinhava”, como davam conta os nossos colegas de redacção.

“Os dons da sua acção participante”

João Castanheira Nunes, para além de ter sido um “jornalista de garra”, “sócio-gerente da empresa proprietária do nosso jornal”, era desde 25 de Outubro de 1956 o editor e director-adjunto de A Comarca de Arganil, aquando o falecimento de seu tio José Castanheira Nunes, contudo, estes não foram os únicos cargos que ocupou e que defendeu.
“De facto, quem não se lembra do calor com que nestas colunas, a campanha de angariação de accionistas para a constituição da empresa do Teatro Alves Coelho? (…) E quem, do mesmo modo, pode esquecer o papel que desempenhou para a construção do novo Quartel dos Bombeiros Voluntários Argus?”, mas segundo os factos registados pelas colecções do nosso jornal, este ser fez muito mais pela nossa terra e pela nossa região.
Assim, de forma alguma podemos “olvidar a luta pelo saudoso extinto travada em prol da criação do Ensino Preparatório e Secundário em Arganil; pela construção da Escola Secundária, em fase já bastante adiantada; pelo prolongamento da Avenida de Amandos até à Barreira; pelo alargamento da estrada de Arganil ao Sarzedo, pela concretização do caminho-de-ferro de Arganil, pela beneficiação da Estrada da Beira, pela edificação da Pousada do Mont’Alto – estas 4 obras ainda infelizmente sem realização; pela construção das casas do Património dos Pobres, pelas Colónias Balneares Infantis de A Comarca e da Paróquia de Arganil; etc; etc..”, recordava A Comarca de Arganil de 17 de Novembro de 1981.
E porque estamos a falar de um “gigante”, “quando chamado para a vereação municipal de Arganil” para o pelouro do turismo, não negou, porque “vivia, com uma intensidade real e não aparente, os problemas do próximo. (…) E até no Lions Club de Arganil de que foi um dos fundadores, sempre deixou os dons da sua acção participante”.
Perante este curriculum é pertinente questionar se “tinha João Castanheira Nunes inimigos? Pois naturalmente que sim. Só os não tem quem nada vale. E ele valia muito”, referem os nossos repórteres numa das edições enlutadas pela perda.

Soldado da Paz

Enquanto Soldado da Paz, “os Bombeiros foram para si quase uma obsessão”, salientam os nossos colegas numa das edições entristecidas pela perda.
O facto de A Comarca de Arganil ter recebido a medalha de ouro – 2 estrelas, por parte da Liga dos Bombeiros Portugueses tem explicação na entrega e dedicação com que este “jornalista de garra” serviu esta Associação que tem por lema “Vida por vida”. A ele se deve “o parque de viaturas dos Bombeiros de Arganil” que, como comprova a edição de 17 de Novembro de 1981, “foi notavelmente enriquecido; as instalações ampliadas; o corpo activo aumentado e aperfeiçoado”.
Deixou o cargo de Comandante dos Bombeiros “após 18 anos de fecunda actividade, (…) pediu a sua demissão daquele cargo em 10 de Maio de 1974, passando ao quadro honorário”, nunca deixando de levar a efeito acções em prol do bem-estar comum.

“Jamais ouviremos a sua voz de comando, mas jamais a esqueceremos”

Este homem era daqueles que “parecendo duro, tinha afinal um coração extremamente sensível, uma ternura a toda a prova. Quem bem o conheceu, sabe bem que isto é verdade”, e sabe que “à custa de uma ginástica quase homérica, transformara uma tipografia praticamente artesanal numa unidade gráfica de considerável dimensão”.
João Castanheira Nunes apesar de ter um coração enorme tinha na “sua caneta (…) a arma permanentemente apontada para o bem-comum e as colunas deste trissemanário o seu campo de batalha”.
No editorial de 1956, quando foi nomeado editor e director deste bissemanário regionalista, foi sublime na arte de expressar o seu propósito enquanto timoneiro deste jornal, e “se bem o prometeu, melhor o cumpriu!”. “Servir sempre com devoção, carinho, entusiasmo e firmeza, esta causa nobre do Regionalismo. Respeitar e dar continuidade ao programa inicialmente estabelecido e sempre cumprido através dos 56 anos de existência ininterrupta do nosso jornal, vividos sempre ao serviço da Pátria e desta nossa linda região das Beiras. E fazer tudo quanto as nossas forças no-lo permitam, para que A Comarca continue a ser o porta-voz sincero das legítimas aspirações de todas as localidades da nossa região, das mais importantes às mais humildes”, referiu.

Até um dia…

Certamente, muitos ainda se recordam de “quando a urna surgiu aos ombros de Bombeiros e trabalhadores de A COMARCA, a emoção foi indescritível, vendo-se lágrimas nos olhos de quase todos os presentes. A sirene do quartel e das viaturas dos Bombeiros silvaram neste momento”.
No dia do funeral vários populares estiveram presentes no adeus a José Castanheira Nunes, “o comércio associou-se ao luto” (fechou na tarde de Domingo), “vários órgãos de comunicação social se referiram ao falecimento do nosso saudoso editor, entre os quais «O Comércio do Porto», «O Primeiro de Janeiro», «Domingo» (…), também a RDP”.
O seu corpo repousa junto da memória de José Castanheira Nunes (seu tio), Eugénio Moreira, Lopes da Costa, entre outros que viveram em prol da sua terra e da sua região, tendo em mente denunciar o bem e o mal presente em cada lugar.
Resta-nos pois continuar o seu trabalho em respeito à sua memória e à de todos aqueles que por aqui passaram que como ele souberam “marcar brilhantemente a sua posição neste jornal e no Regionalismo”.

Cristina Correia Pinto
In A Comarca de Arganil

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